Cantos

CANTO 1
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Ei-lo, diz-se, que subindo ao Paço, o livro com um saber de experiências feito. Diz-se. E o Rei futuro, inclina-se, a jovem cabeça sobre o colo de Nemésis. Que ele traz o Tempo inteiro em Oitavas e ao Canto se propõe do peito ilustre lusitano. Cala-se o Antigo, do atrevido troiano, fugitivo Eneidas e mesmo daquele Orlando, inda que fora verdadeiro. Dadivosas, as Tágides invoca e, ledas, lhe concedem elas a tuba canora, de Homero a cítara só cobiçando. Ele é o épico, o do humano e concreto fazer. E se anuncia Nuno Àlvares, os Magriços, Albuquerque Terrível, o heróico Gama, é que já no Oceano os argonautas as ondas vão apartando e há o Oriente, e outro Oriente a Oriente do Oriente. Mas isso será depois do Poema. Que já os Deuses no Olimpo se assentam: Júpiter, Mercúrio, Vénus, Baco. E de fortes razões se interpelam sobre as cousas futuras daquele Oriente que a lusa gente, tão ousada persegue. E, desavindos, tomam partido. Ditosa Vénus que os argonautas favorece, com Júpiter, magnânimo pai. Colérico, Baco, em ardis e perigosos enganos, a afoita empresa almejando que soçobre. Quando já eles, os novos argonautas, a Índica costa alcançam, dobrado a Etiópica terra e o temeroso Cabo.
Inda agora ele lê, diz-se, o Vate. E lerá depois, os veros casos e o maravilhoso e os muitos sentidos da aventurosa humana gesta, a da viagem e a da lusitana Historia. Mas isso é o Poema inteiro. Que, ei-lo, o épico, do dino Gama a pose descrevendo e o seu trato com as coloridas gentes, e os sons, a enleada curiosidade, o que lhe dizem – e é das primeiras vezes em camoniana língua registada – dessa Ilha que habitam, de Moçambique chamada.
Mas já Baco, furioso, novos ardis vai tecendo, ao mouro armadilhas instigando. Pois que é o Oriente o que buscam, não de Quíloa ou Mombaça, onde forte peleja os espera e de mais danos, os ventos enganando, os salva a ditosa Vénus desejada. Mas isso será no Poema Inteiro, na Ilha dos Amores aos heróis ofertada.
Diz-se que subiu ao Paço. Inda agora lê. Ele que mandou cessar a antiga Musa. E a gente vil, a Máquina do Mundo, a sublime humana condição, os desfavores da Pátria, tudo conhece.
Lê. Diz. E é o primeiro Canto.

Luís Carlos Patraquim

______________________________________________SINOPSE

Começa com a estrutura própria de uma Epopeia:
Proposição (3 primeiras estrofes): O poeta diz o que é que vai contar/cantar;
Invocação (estrofes 4 e 5): Pede ajuda às Ninfas do Tejo para o inspirar;
Dedicatória (da estrofe 6 à 19): Dedica o poema a D. Sebastião, incita-o a fazer grandes coisas e pede-lhe que dê atenção à sua obra;

Narração (a partir da estrofe 19): começa a contar a história: a armada está no mar quando os deuses se reúnem para deliberarem sobre esta empresa. Temos o concílio dos deuses (estrofes 20 a 42): Os deuses vêm pela Via Láctea de toda a parte, do Norte do Sul, … acomodam-se (estrofes 20 a 23) e Júpiter expõe a situação e diz que os portugueses devem ser bem tratados (estrofes 24 a 30). Os deuses não estão todos de acordo, Baco está contra os portugueses (estrofes 30 a 32), Vénus está a favor dos portugueses (estrofes 33 e 34), Marte ataca Baco e defende Vénus (estrofes 36 a 40), Júpiter está de acordo com Marte e vão-se todos embora (estrofe 41).

Voltamos à armada que está nas imediações da Ilha de Moçambique em Fevereiro (estrofe 42 a 45). Entram em contacto com os pretos que ali vivem que são muçulmanos (estrofes 45 a 49). Vasco da Gama recebe-os na armada, apresentam-se uns aos outros, comem e bebem e vão-se embora (estrofes 49 a 56). Cai a noite e na armada fica toda a gente a ruminar (estrofes 56 a 58).
Nasce o dia e a armada prepara-se para receber o regente da Ilha de Moçambique (estrofe 59). O regente entra na Nau muito desconfiado, Vasco da Gama recebe-o, dá-lhe presentes e o regente, desconfiado, faz-lhe muitas perguntas a que o Gama responde (estofes 60 a 69). O mouro fica ainda mais desconfiado e começa a magicar uma maneira de dar cabo dos portugueses. Vai-se embora mostrando-se muito amiguinho (estrofes 69 a 73).

Voltamos aos deuses.
Baco, o “Grão Tebano”, está furioso e diz que vai convencer os mouros a darem cabo dos portugueses (estrofes 73 a 77). Disfarça-se de mouro velho e sábio e vai à corte do Xeque faz uma grande intriga e convence-o a armar-se contra os portugueses para dar cabo deles quando vierem buscar água (estrofes 77 a 84). Nasce o Sol e os Lusitanos vão, meio desconfiados, buscar água a terra. Encontram os mouros prontos para lhes darem uma sova. Vira-se o feitiço contra o feiticeiro e eles é que apanham uma grande sova e fogem como podem para terra (estrofes 84 a 93).

Os portugueses tornam para as naus cheios de riquezas e vão a terra buscar água. O Xeque faz de conta que está muito arrependido, pede a paz e dá-lhes um piloto industriado para os destruir (estrofes 93 e 94). Vasco da Gama decide prosseguir a viagem. O piloto começa a dar-lhe informações falsas, diz que em Quíloa há cristãos, o que não é verdade. Vasco da Gama, ingénuo, fica extasiado com essa informação e vai para lá (estrofes 95 a 100). Mas Citera (Vénus) vai em socorro dos portugueses e desvia a armada de Quíloa (estrofe 100). Mas o mentiroso mouro prossegue na ofensiva e convence o Gama a ir para Mombaça, onde, diz ele, há cristãos e mouros que vivem juntamente – outra mentira. Mas Vénus impede a entrada em Mombaça. Ficam ao largo (estrofes 101 a 103). O rei de Mombaça manda embaixadores com falsas promessas de amizade. A intenção é destrui-los (estrofes 104 e 105).
Fim do canto com considerações de Camões sobre os perigos da vida (estrofes 105 e 106). O caso está muito feio para os portugueses.
____________________________________________ANTOLOGIA
...
Ó grandes e gravíssimos perigos!
Ó caminho de vida nunca certo!
Que aonde a gente põe sua esperança,
Tenha a vida tão pouca segurança!

No mar tanta tormenta e tanto dano,
Tantas vezes a morte apercebida!
Na terra tanta guerra, tanto engano,
Tanta necessidade aborrecida!
Aonde pode acolher-se um fraco humano
Onde terá segura a curta vida
Que não se arme e se indigne o céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno?


CANTO 2
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Chega a Mombaça a armada lusa, e o rei da terra procura atrair os Portugueses a uma emboscada, a pretexto de lhes oferecer especiarias e jóias. O próprio Baco, para melhor os enganar, forja um altar que representa o Pentecostes, enganando com isso os dois enviados do Gama. Mas enquanto o Gama recebe nas naus os falsos Mouros, Vénus voa para o salvar com ajuda das Nereidas que desviam com o peito as naus da barra inimiga, o que leva os Mouros a fugir para terra, denunciando com isso os seus propósitos. Vai então Vénus falar a Júpiter, mostrando-lhe a beleza do corpo para o comover e seduzir, conseguindo assim que o Deus lhe augure o fim feliz da expedição, e faça com que Mercúrio apareça em sonho ao Gama a indicar o caminho de Melinde, porto seguro onde o rei da terra o recebe, com troca de presentes e festas que se prolongam pela noite. E no encontro do Gama e do Rei ambos exibem as mais ricas vestes, iniciando o diálogo que os fará contar os sucessos de cada país, dando o Gama início à narrativa dos feitos passados dos portugueses.
Nuno Júdice

________________________________________________SINOPSE
O Sol está a pôr-se (estrofe 1) quando o rei de Mombaça manda um embaixador para convencer o Gama a desembarcar (est. 2 a 5).
Vasco da Gama agradece, diz que agora é perigoso navegar porque está noite mas quando nascer o dia vai a terra. Pede informações ao embaixador e manda dois espiões para ver se há cristãos em terra por eles manda presentes ao rei (est. 5 a 8). Os espiões lá foram mas os mouros estavam muito desconfiados. Baco disfarça-se de cristão, constrói um altar onde reza como se fosse cristão e com isso engana os espiões, que são muito bem tratados. Convencem-se que há cristãos (est. 9 a 14). Voltam para a armada a dizer que é gente de confiança. O Gama resolve receber os mouros nas naus, que vão com a intenção de dar cabo daquilo tudo e assim vingar-se da sova que apanharam na Ilha de Moçambique (est. 14 a 18). Mas a “linda Ericina” (Vénus) percebendo a traição desce do céu,vai ao mar ter com as Nereidas suas amigas, empurram as naus para fora do porto e impedem que a frota entre em Mombaça onde seria destruída (est. 18 a 25). Levanta-se uma grande algazarra nas naus, os mouros pensam que os portugueses descobriram a sua traição e fogem para terra como podem (est. 25 a 29). O Gama então percebe o que se estava a passar e pede ajuda a Deus (est. 29 a 33). Dione (Vénus) comovida com a prece do Gama e com o que está a acontecer aos portugueses, toda dengosa e mimalha, vai fazer queixinhas a Júpiter, pai dela (est. 33 a 42). Júpiter todo aceso, sossega a filha e por pouco a coisa não se dava… (est. 42 a 44). Revela-lhe tudo o que os portugueses vão fazer no Oriente (est. 44 a 56).
Começa logo a agir: manda Mercúrio a Melinde para predispor a população para receber os portugueses (est. 56 a 59) e, em sonhos, diz ao Gama o que ele deve fazer (est. 59 a 64). Gama acredita no sonho e parte para Melinde (est. 64 a 69). No caminho aprisiona uns mouros que lhe dizem que o rei de Melinde é fantástico. E partem para Melinde (est. 69 a 72).

Chegam a Melinde no dia de Páscoa, ficam ao largo, são recebidos apoteoticamente pela população e pelo rei e Vasco da Gama manda um embaixador a terra e com ele presentes ao rei para obter dele a amizade (est. 72 a 79). O embaixador faz um discurso comovente ao rei (est. 79 a 85), este tranquiliza-o e diz que está disposto a ajudar os portugueses. Quando o sol nascer vai visitar a armada (est. 85 a 89). O embaixador volta para a armada e fazem uma grande festa (est. 89 a 92).

Nasce sol e o rei de Melinde prepara-se para ir visitar a armada (est. 92 a 97). Vasco da Gama prepara-se para ir ao encontro do rei. O encontro dá-se em pleno mar e fazem-se as apresentações (est. 97 a 106). Feitos os discursos e salamaleques habituais o rei visita as naus, pergunta muitas coisas e pede a Vasco da Gama que conte a história da Europa e de Portugal e da viagem que está a fazer. Já conhece os portugueses de ouvir falar, que os Melindanos são pretos mas não são incultos. Diz que o que os portugueses fizeram e estão a fazer, esta viagem, é mais importante que outros feitos antigos que mereceram ficar na História (est.106 a 113). Tudo isto no meio do mar e com o sol a nascer (est.110).~

CANTO 3
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Quando os poetas clamam por ajuda, sem se mostrarem, os deuses vêm. Neste caso, Camões chamou por Calíope e a musa enviou-lhe os seus favores. Bem precisava deles o poeta. Pois como poderia ele, sozinho, invocar o feliz entendimento entre os viajantes portugueses e o bom Rei de Melinde? Como poderia, sozinho, sem ajuda divina, reconstituir o diálogo entre eles? Reproduzir a descrição que o Gama fez da Europa, para satisfazer a curiosidade do Rei? E a descrição da Península Ibérica como cabeça da Europa? E de Portugal, o quase cume da cabeça/ de Europa toda? Sim, como poderia, sozinho, Camões invocar os povos europeus, e os ibéricos, e entre eles destacar a força do povo lusitano? E invocar os bravos reis Afonsos, desde Afonso Henriques, o fundador, a Afonso IV, o rei da Batalha do Salado? Passando por Dinis, o rei da poesia, da boa ordem e do progresso? E como poderia Camões, sem a ajuda de Calíope, descrever o amor em Portugal? Falar de Dom Pedro, feito Cru, por amor de Inês de Castro, a bela, boa e inocente vítima dos Estados, e o amor do fraco, Dom Fernando, à beira de deixar perder o reino, por uma mulher oposta àquela? Que um fraco Rei faz fraca a forte gente, explicou o Gama ao Rei de Melinde, preparando-se para fazer uma pausa entre o Terceiro e o Quarto Canto. Provavelmente era de noite, viajantes e hospedeiros naquela Costa de Moçambique iriam dormir, Camões também, mas Calíope, a musa, iria ficar sobre as águas, à espera que amanhecesse sobre o Índico e houvesse mais História portuguesa para contar.

Lídia Jorge

________________________________________________SINOPSE
O Gama vai então satisfazer o pedido que o rei de Melinde lhe fez: contar a história da terra de onde veio e sobretudo a História de Portugal e da viagem até Melinde.
Camões, para dizer o que o Gama contou (que só vai acabar quase no fim do canto V), começa por pedir ajuda à musa Calíope e diz então o que é que o Gama contou ao rei de Melinde e à corte, ancorados no meio do mar, começando pela “larga terra” prometendo que depois dirá da “sanguinosa guerra” (est. 1 a 6).
Descreve a geografia da Europa, a sua localização no globo terrestre, fronteiras, as diversas zonas e respectivos povos, seguindo o conhecimento mais comum do fim do século XV (est. 6 a 20).
Chega a Portugal, e começa a contar a história da origem de Portugal, desde Viriato ao conde D. Henrique, Dona Teresa e os problemas que teve com o filho, Afonso Henriques, as guerras de Afonso Henriques com Castela e o episódio de Egas Moniz (est. 20 a 42).
Resolvidos os problemas com Castela, Afonso Henriques inicia a conquista das terras aos mouros com a batalha de Ourique. Imediatamente antes desta batalha Cristo aparece a Afonso Henriques. O exército, impressionado com este milagre, aclama-o rei. Segue-se a batalha. Os portugueses vencem (est. 42 a 53). Afonso Henriques pinta os escudos na bandeira (est. 53 e 54).
Continuam as conquistas: Leiria, Arronches, Santarém, Mafra, Sintra. Cerca Lisboa e com a ajuda dos Cruzados toma a capital. Continua as conquistas: Óbidos Alenquer, Torres Vedras, Alentejo “Terras transtaganas”, Évora, Beja, Palmela, Sesimbra e vai cercar Badajoz, onde é vencido pelos Leoneses, cujo rei era genro de Afonso Henriques (est. 54 a 71).
Gama compara Afonso Henriques a Pompeio (est. 71 a 74) e prossegue com a acção de Afonso Henriques que delega no filho Sancho a responsabilidade pela continuação da conquista. Os mouros vêm todos do Norte de África e vão cercar Santarém onde está Sancho. Afonso Henriques, que estava em Coimbra, vai ajudar o filho e vencem os mouros. Morre Afonso Henriques e Sancho é aclamado rei (est. 74 a 85).
Continuam as conquistas: Silves, com a ajuda dos Cruzados e zonas da Galiza (Tui). Sucede-lhe Afonso II, que morre sem grande história, a quem sucede Sancho II.
Sancho II não é grande rei e foi substituído pelo irmão, Afonso III, que conquista o Algarve. E acabam as conquistas. O reino está em paz (est. 85 a 96). Depois vem Dom Dinis a quem sucede Afonso IV, que não gosta muito dos Castelhanos mas vai ajudá-los na guerra contra os mouros, porque a filha “formosíssima Maria”, casada com o rei de Castela vem à corte pedir-lhe ajuda (Est. 96 a 107). Deste pedido segue-se a batalha do Salado (est. 107 a 118). Afonso IV volta da batalha e temos os amores de Pedro e Inês com a morte de Inês de Castro (est. 118 a 136).
Segue-se a vingança de Pedro e o seu reinado. Sucede-lhe Dom Fernando e as alhadas amorosas em que se meteu e as reflexões que o Gama (Camões) faz sobre o amor (est.136 a 143).

CANTO 4
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Morto D. Fernando, periga a independência quando a herdeira do trono está para ser D. Beatriz, casada com o estafermo do rei de Castela. Fez o povo grande juízo e levou, ao invés, D. João I, bastardo de D. Pedro, a rei, para ser escudo maior no brio de Portugal. É que, em agosto de 1385, D. João enfrenta os castelhanos em Aljubarrota, que vem a ser a maior derrota que infligimos aos nossos insistentes predadores. Escorraçados, começa então a conquista do norte de África com a posse de Ceuta.
Sucede D. Duarte a D. João I mas fica-se pelas tristezas e pouco mais. Havíamos de esperar por D. Afonso V para que seguisse a tentativa de conquistar Marrocos em prol da sempre imaculada fé cristã (desculpem, mas aqui tenho de dizer, que nervos). E toma-se Alcácer, Tânger e Arzila.
Sucede D. João II que quis saber como chegar à Índia. Pero da Covilhã e Afonso de Paiva partiram e viram de Espanha à Itália, da Etiópia ao Golfo Pérsico, mas haviam de ficar pela Península Arábica, sem novo avanço nem regresso.
D. Manuel, agora sim, sonha com dois velhos de fartas barbas, certamente barbados de água, por serem um o rio Indo e outro o rio Ganges. E os velhos incentivam-no à viagem e à glória de dominar as terras e as gentes indianas.
Chamado Vasco da Gama, junto a seu irmão Paulo da Gama e também a Nicolau Coelho, constitui-se a grande armada que, por obstinada convicção, haveria de saber chegar ao destino. À partida das naus, depois de cerimónia religiosa e procissão à praia do Restelo, entre os tristes pela partida e os valentes, um velho amaldiçoa quem por loucura prometeu grandezas, amaldiçoa quem pela primeira vez construiu um barco, que já bastante havia de ser a vida como era, a partida cumpria só o vício da ilusão.

Valter Hugo Mãe

________________________________________________SINOPSE

Com a morte de Dom Fernando segue-se a crise de 1383 e as revoltas populares que matam o Conde Andeiro. Leonor Teles, regente do reino, tenta impor a filha Beatriz como rainha e pede ajuda ao rei de Castela que está casado com a filha. Castela prepara-se para a guerra (est. 1 a 12).
João I junta as forças portuguesas, que são poucas. Muitos nobres passaram-se para o partido castelhano, entre quais os irmãos de Nuno Álvares Pereira. Este incita os nobres a combaterem ao lado de João I. Consegue os seus intentos e, juntamente com a ajuda do povo, João I reúne um exército, comandado por Nuno Álvares Pereira para combater os castelhanos (est. 12 a 28).
Está tudo pronto para a batalha de Aljubarrota. Começa a batalha. Os portugueses cedem. João I anima-os. Recuperam e vencem (est. 28 a 45). Nuno Álvares Pereira parte para o Alentejo e é feita a paz com Castela (est. 45 a 48).

João I inicia a conquista do norte de África. Sucede-lhe Duarte que não foi muito feliz. Afonso V continua a conquista do norte de África e é vencido por Fernando de Aragão (est. 48 a 61).
João II sucede ao pai e manda espiões (Pêro da Covilhã e Afonso de Paiva) por terra para saber notícias da Índia (est. 61 a 66).
Manuel I sucede a João II e tem um sonho: sonha que os rios Indo e Ganges lhe dizem para ir conquistar a Índia (est. 66 a 76). Acredita no sonho e encarrega o Gama (não esquecer que é Vasco da Gama que está a contar a história) de organizar uma expedição para tal efeito (est. 76 a 81). Gama aceita, radiante, e começa os preparativos para a viagem, nas praias de Belém (est. 81 a 87.).
Os navegadores saem da igreja de Belém, metem-se nas naus e dá-se a despedida (est. 87 a 94). Tinham acabado de partir quando um velho começa a perorar na praia (est. 94 a 105).

João I inicia a conquista do norte de África. Sucede-lhe Duarte que não foi muito feliz. Afonso V continua a conquista do norte de África e é vencido por Fernando de Aragão (est. 48 a 61).
João II sucede ao pai e manda espiões (Pêro da Covilhã e Afonso de Paiva) por terra para saber notícias da Índia (est. 61 a 66).
Manuel I sucede a João II e tem um sonho: sonha que os rios Indo e Ganges lhe dizem para ir conquistar a Índia (est. 66 a 76). Acredita no sonho e encarrega o Gama (não esquecer que é Vasco da Gama que está a contar a história) de organizar uma expedição para tal efeito (est. 76 a 81). Gama aceita, radiante, e começa os preparativos para a viagem, nas praias de Belém (est. 81 a 87.).
Os navegadores saem da igreja de Belém, metem-se nas naus e dá-se a despedida ( est. 87 a 94). Tinham acabado de partir quando um velho começa a perorar na praia (est. 94 a 105).

_____________________________________________ANTOLOGIA

Que neurobiólogo ou psicólogo explicaria melhor o pânico do que esta estrofe (imediatamente antes da batalha de Aljubarrota)?

Quantos rostos ali se vêem sem cor,
Que ao coração acode o sangue amigo!
Que, nos perigos grandes, o temor
É maior, muitas vezes que o perigo.
E, se não o é, parece-o, que o furor
De ofender ou vencer o duro imigo
Faz não sentir que é perda grande e rara
Dos membros corporais a vida cara.


CANTO 5
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Deixada para trás a pequena pátria extrema no encalço de um sonho de lonjura pelo mar imenso que haveria de trazer tragédia e glória a nautas e reis, eis que a obra (descobrimento e escritura) se expande nas tensões do vivido e do escrito, rompendo quer com a gramática pragmática, quer com a poética nas suas já estioladas convenções.
Porém, não chamaria aos Lusíadas (pela ressonância teológica)como fez Nemésio, tábua da lei do português enquanto povo de missão, mas cartografia duma humanidade outra, viciosa e bárbara que seja; da pátria que deveras importa, essa que apenas a arte pode fundar, tal essa mítica Atlântida ou Hespérides, que dizem ser Cabo Verde vestígio, que importa mais a invenção que o testemunho, e importará sobremaneira a nós caboverdianos, futuro povo inventado na pátria sem nome, pois que do cabo nos ficou apenas a denominação para uso e memória, signo e sina dos perscrutadores do meio do atlântico, de almas temperadas de viagem e maresia.

José Luís Tavares
________________________________________________SINOPSE
Ainda o velho estava a vociferar quando se afastam da costa e entram no mar largo. Passam a costa de Marrocos e a Madeira, a costa do Sara, Trópico de Câncer e as Canárias, Cabo Verde e a Costa da Guiné, o Congo e o Equador (est. 1 a 16).
Gama interrompe a história da viagem para contar ao rei fenómenos marítimos: as tempestades, o fogo de Sant’elmo a tromba d’água (est.16 a 24).
Já passaram o Trópico de Capricórnio e desembarcam na Baía de Santa Helena onde se dá o episódio do Fernão Veloso (est.24 a 37). Continuam a viagem, estão junto ao Cabo das Tormentas e aparece-lhes o Adamastor que os ameaça com tudo o que vão sofrer no futuro por terem ousado esta empresa (est.37 a 49).
O Gama ousa interpelar o Gigante e pergunta-lhe quem é. O Gigante conta-lhe então o seu amor por Tétis, o desprezo a que ela o vota por ser feio e o castigo a que os deuses o condenam (est.49 a 61).
Continua a narração da viagem, já pelo Oceano Índico, vão a terra, entram em contacto com uns pretos simpáticos mas ignorantes da Índia. Prosseguem a viagem e no dia de Reis entram num rio onde encontram mais pretos e onde se abastecem de mantimentos (est. 61 a 70). Aqui o Gama comenta com o rei de Melinde os seus trabalhos (est. 70 a 73).
Continua a narração da viagem, e finalmente encontram alguém que lhes pode dar notícias da Índia e deixam-se ficar um pouco por lá, onde são atacados pelo escorbuto e muitos morrem (est. 73 a 84).
O Gama continua a contar a viagem até à corte do rei de Melinde onde agora se encontram e tão confortáveis!... concluindo assim a história que lhe havia pedido o rei. Insiste que esta é uma história com factos verdadeiros e não como a Odisseia ou a Eneida, cheia de coisas inventadas. Todos ficam muito admirados e o rei volta para a corte, quando o sol estava a pôr-se. (est. 84 a 92).
Considerações finais do Camões sobre a fama, a literatura, os feitos heróicos, e a ignorância dos capitães lusitanos, entre outros temas (est. 92 a 100).

_____________________________________________ANTOLOGIA
...
Enfim, não houve forte Capitão
Que não fosse também douto e ciente,
Da Lácia, Grega ou Bárbara nação,
Senão da Portuguesa tão-somente.
Sem vergonha o não digo, que a razão
De algum não ser por versos excelente
É não se ver prezado o verso e rima,
Porque quem não sabe arte não na estima.
...
Mas o pior de tudo é que a ventura
Tão ásperos os fez e tão austeros,
Tão rudos e de engenho tão remisso,
Que a muitos lhe dá pouco ou nada disso.
...
Porém não deixe, enfim, de ter disposto
Ninguém a grandes obras sempre o peito
Que, por esta ou por outra qualquer via,
Não perderá seu preço e sua valia.
 
 
CANTO 6
______________________________________________________

Capitão ou prefere que o trate antes por Vasco? Esta noite somos só nós dois que estamos aqui a vigiar o mar. Meu amo ordena-me que o leve até Calecut. Pode estar descansado que não há outro piloto que conheça tão bem essas paragens como o Salem. Também abundam por aqui piratas. Aparecem de todos os lados. Este mar está a saque. É a primeira vez que navega por estes lados? Calculo que não tenha medo de piratas. As bocas-de-fogo que ornamentam os seus navios assustam qualquer armada. Foi por isso que o meu amo o recebeu e fê-lo seu aliado. Para que os seus inimigos vejam quem o protege. Repare como os seus homens estão sossegados. Veloso, creio que se chama Veloso, é muito engraçado. Deve estar a contar outra vez essa história dos doze magriços. Contou-a em Melinde a quem o quisesse ouvir. Contou-a como se tivesse sido ele quem salvou a honra das donzelas. Capitão, que rosto sério é este que mostra? Está preocupado com este vento que se levanta? Aqui chama-se monção. Massas de ar que se deslocam por causa do aquecimento da terra. O pior é quando tudo treme e as ondas se agigantam. Não é feitiço dos deuses, capitão. A Índia, para onde vai, é que é uma terra cheia de deuses como esses que povoam agora a sua cabeça e o faz tremer de medo. Esqueça o Baco e esqueça o Neptuno. São de outro mar. Se quiser pode pedir a protecção do seu Deus. Se ajudou o povo hebreu a atravessar o Mar Vermelho, talvez o venha ajudar a acalmar os seus homens. Não se esqueça capitão, não se esqueça. Quem de facto o leva a Calecut é o Salem, muçulmano de Melinde.

Luis Cardoso
______________________________________________SINOPSE

A armada despede-se de Melinde e ruma à Índia
Mas Baco faz das suas: vai ter com Neptuno, rei do mar e convence-o a reunir todos os deuses do mar para que decidam a destruição da armada.
A armada navega calmamente. É de noite. As sentinelas não sabem como hão-de passar o tempo e Veloso conta a estória do Magriço.
De repente… A tempestade!...
Mas Vénus solta as ninfas, namoradas dos ventos e, com amor, acalma tudo
Chegam a Calecut.

_____________________________________________ANTOLOGIA


A nau grande, em que vai Paulo da Gama, 
Quebrado leva o mastro pelo meio,
Quási toda alagada; a gente chama
Aquele que a salvar o mundo veio.
Não menos gritos vãos ao ar derrama
Toda a nau de Coelho, com receio,
Conquanto teve o mestre tanto tento
Que primeiro amainou que desse o vento.

Agora sobre as nuvens os subiam
As ondas de Neptuno furibundo;
Agora a ver parece que desciam
As íntimas entranhas do Profundo.
Noto, Austro, Bóreas, Áquilo, queriam
Arruinar a máquina do Mundo;
A noite negra e feia se alumia
Cos raios em que o Pólo todo ardia!

As Alciónias aves triste canto
Junto da costa brava levantaram,
Lembrando-se de seu passado pranto,
Que as furiosas águas lhe causaram.
Os delfins namorados, entretanto,
Lá nas covas marítimas entraram,
Fugindo à tempestade e ventos duros,
Que nem no fundo os deixa estar seguros.
….


CANTO 7
______________________________________________________
 
Antes de apresentar a Índia Camões comenta a situação político-religiosa da Europa no século XVI.
Desembarcam e encontram Monçaide, um mouro que sabe castelhano e que lhes serve de guia e intérprete.
Vêem os templos indianos a caminho do palácio do rei e já nos jardins deste a história da Índia pintada e esculpida.
Vasco da Gama é recebido pelo Samorim e diz-lhe ao que vai. Ele mostra-se prudente. Quer saber mais do rei, da gente e da terra donde vêm. Encarrega isso o Catual que visita as naus com Monçaide.
Camões está cansado. Queixa-se às musas dos poderosos

 _____________________________________________ANTOLOGIA

……
 – ‘Um grande Rei, de lá das partes onde     
O Céu volúbil, com perpétua roda,
Da terra a luz solar co a Terra esconde,

Tingindo, a que deixou, de escura noda,
Ouvindo do rumor que lá responde
O eco, como em ti da Índia toda
O principado está e a majestade,
Vínculo quer contigo de amizade.


E por longos rodeios a ti manda
Por te fazer saber que tudo aquilo
Que sobre o mar, que sobre as terras anda,
De riquezas, de lá do Tejo ao Nilo,
E desd' a fria plaga de Gelanda
Até bem donde o Sol não muda o estilo
Nos dias, sobre a gente de Etiópia,
Tudo tem no seu Reino em grande cópia.


E se queres, com pactos e lianças
De paz e de amizade, sacra e nua,
Comércio consentir das abondanças
Das fazendas da terra sua e tua,
Por que cresçam as rendas e abastanças          
(Por quem a gente mais trabalha e sua)
De vossos Reinos, será certamente
De ti proveito, e dele glória ingente.                                                             

E sendo assim que o nó desta amizade       
Entre vós firmemente permaneça,
Estará pronto a toda adversidade
Que por guerra a teu Reino se ofereça,
Com gente, armas e naus, de qualidade
Que por irmão te tenha e te conheça;
E da vontade em ti sobre isto posta
Me dês a mim certíssima resposta.’


Tal embaixada dava o Capitão,
A quem o Rei gentio respondia
Que, em ver embaixadores de nação
Tão remota, grão glória recebia;
Mas neste caso a última tenção
Com os de seu conselho tomaria,
Informando-se certo de quem era
O Rei e a gente e terra que dissera;



CANTO 8
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Continua a correr o mês de maio de 1498, indicamente falando, em Calecute.

As personagens agitam-se: mostram, explicam, apresentam, desconfiam, sonham, enganam, aceitam. E contam. Paulo da Gama recebe, a bordo, o Catual, governador local, e explica-lhe o significado das figuras pintadas nas bandeiras. Já na época havia intérpretes, como este mauritano, de nome Monçaide, que tinha vivido em Castela e estava sempre presente. E as narrativas começam, numa síntese prolongada da história de Portugal, desde os mitos fundadores da Lusitânia e da cidade de Lisboa, até às referências relevantes, por onde passam Viriato, o conde D. Henrique, D. Afonso Henriques, Egas Moniz, vários nobres, Álvares Pereira e João I, pintados estes com a batalha de Aljubarrota.

E, depois de perguntas e respostas, o Catual regressa a terra e a noite chega. Alguns adivinhadores do futuro preveem destruição e cativeiro com a chegada desta frota. E é nesta mesma noite que o deus Baco (imagine-se o deus do vinho contra os portugueses!) entra nos sonhos de um sacerdote muçulmano e amaldiçoa os que chegam, futurando “piráticas rapinas”. Quando acorda, o sonhador espalha as falas de Baco e incita os seus à luta. Apesar de tudo, Vasco da Gama procura entender-se com o rei local, o Samorim ou “senhor dos mares”, e pede-lhe para o deixar regressar à frota, com vista à troca de produtos.

Já na margem, o Catual diz ao capitão português para trazer a frota para mais perto de terra, para poder embarcar. O que tinha em vista, afinal, era a sua destruição, imagine-se. E, aqui, entra a astúcia e a desconfiança de Vasco da Gama que não aceita a proposta e é preso. Mas este governador menor tem receio do rei e propõe a sua libertação em troca das mercadorias portuguesas. E Vasco da Gama aceita e compra a liberdade, lembrando-se que a sua missão, afinal, era maior do que a submissão ao vil metal luzente.

Firmino Mendes


 ______________________________________________SINOPSE

O Catual vai visitar as naus engalanadas com toldos e bandeiras que têm pintadas figuras da História de Portugal que Paulo da Gama explica ao funcionário indiano.
Cai a noite e Baco em sonhos aparece a um mouro para que ele e os amigos intriguem junto dos indianos contra os portugueses.
Entra a corrupção!
O Gama apercebe-se e vai falar com o Samorim antes que seja tarde.
A custo consegue vender e trocar algumas mercadorias.
É a força do dinheiro


  _____________________________________________ANTOLOGIA

…..
Qual o reflexo lume do polido                     
Espelho de aço ou de cristal fermoso,
Que, do raio solar sendo ferido,

Vai ferir noutra parte, luminoso,
E, sendo da ociosa mão movido,
Pela casa, do moço curioso,
Anda pelas paredes e telhado
Trémulo, aqui e ali, e dessossegado:

 …..
Nas naus estar se deixa, vagaroso,                
Até ver o que o tempo lhe descobre;
Que não se fia já do cobiçoso
Regedor, corrompido e pouco nobre.
Veja agora o juízo curioso
Quanto no rico, assi como no pobre,
Pode o vil interesse e sede imiga
Do dinheiro, que a tudo nos obriga.

A Polidoro mata o Rei Treício,
Só por ficar senhor do grão tesouro;
Entra, pelo fortíssimo edifício,
Com a filha de Acriso a chuva d' ouro;
Pode tanto em Tarpeia avaro vício
Que, a troco do metal luzente e louro,
Entrega aos inimigos a alta torre,
Do qual quase afogada em pago morre.

Este rende munidas fortalezas;
Faz trédoros e falsos os amigos;
Este a mais nobres faz fazer vilezas,
E entrega Capitães aos inimigos;
Este corrompe virginais purezas,
Sem temer de honra ou fama alguns perigos;
Este deprava às vezes as ciências,
Os juízos cegando e as consciências.


Este interpreta mais que sutilmente        
Os textos; este faz e desfaz leis;
Este causa os perjúrios entre a gente
E mil vezes tiranos torna os Reis.
Até os que só a Deus omnipotente
Se dedicam, mil vezes ouvireis
Que corrompe este encantador, e ilude;
Mas não sem cor, contudo, de virtude!

 





CANTO 9
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Continuamos a nos mover entre a viagem dos marinheiros e a intriga dos deuses. Vasco da Gama conseguiu se livrar de dois dias e uma noite em Pandarane, estava preso. Trocou sua liberdade por uns rolos de fazenda. De volta às suas naus dá início à viagem de regresso, Camões não se preocupa em narrar ou dar qualquer notícia disso: Cortando vão as naus a larga via / Do mar ingente pera a pátria amada. O que parece importante é a viagem à Índia. Voltar apenas reabre as linhas não escritas sobre uma visão passada e uma visão futura de Portugal, ao mesmo tempo. Ou seja, é preciso sempre ler o que não foi escrito. E disse Llansol: Penso muitas vezes: e se Vasco da Gama não tivesse voltado?
E em algum ponto inespecífico no meio do mar, que pode ser do oceano Índico ou do Atlântico, Vénus organiza uma surpresa para os navegadores. Um prémio: uma ilha flutuante e encantada recheada de ninfas expandidas de desejo. Enquanto isso, Tétis leva o Gama pela mão até sua morada, e se amam. Antes, amor só onde também há corpo; depois, os marinheiros podem entrar no reino da imortalidade.

Esta convicção da fábula impura é que dá ao homem a sensação de que agora está perfeitamente adequado ao universo.



 
Manoel Ricardo Lima


  ______________________________________________SINOPSE

Braço de ferro entre os mouros e Vasco da Gama que na primeira oportunidade zarpa.

Vénus prepara a Ilha dos Amores com a ajuda de Cupido e dos cupidinhos

A ilha encontra as naus.( Assim mesmo porque ela amanda-a ao seu encontro.)
“Mas que é isto?...” – dizem os marinheiros- As ninfas todas acesas!...Uau!...”
Depois… é o costume.
A glória é uma ilusão que paga o trabalho que se tem.


 
CANTO 10
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A deusa Tétis oferece aos portugueses um banquete em seu palácio, na ilha dos Amores. Todos comem, bebem, conversam e se divertem. Ouve-se música na voz de uma angélica Sereia. A bela Ninfa descreve as realizações dos valorosos varões que os navios vão levando à Ásia, para impor o domínio português. Antes de prosseguir, entretanto, o poeta invoca a musa da poesia épica – Calíope –, uma vez que parece estar ele perdendo o gosto de escrever... A Ninfa ocupa-se, então, dos heróis e governadores da Índia, que são muitos. A eles irão juntar-se tantos outros no futuro para gozar a devida fama. Encerra a Ninfa seu canto, consagrado sob um sonoro aplauso.

Findo o banquete, Tétis conduz Vasco da Gama ao alto de um monte de onde se avista um globo transparente, suspenso no ar. Trata-se da Máquina do Mundo, concebida por Deus e posta ali para ser vista especialmente pelo herói português. A grande máquina, etérea e elemental, é composta por vários orbes sucessivos e concêntricos. Tétis mostra ao Gama, logo depois, os orbes dos sete planetas, detendo-se detalhadamente na Terra, verdadeiro centro de toda a máquina. No orbe terrestre, a deusa descobre os lugares onde os portugueses da Europa cristã vão empreender seus mais altos feitos.

Tétis termina seu discurso, e os viajantes podem, então, partir. Os homens acomodam-se nos navios, em companhia das ninfas, e a viagem prossegue até que eles entram pela “foz do Tejo ameno”. Os audazes navegantes entregam a Sua Majestade o prêmio glorioso: a notícia da descoberta do caminho marítimo para a Índia.


Welington Andrade


  ______________________________________________SINOPSE

A deusa Tétis oferece um jantar reconfortante aos marinheiros que passaram a manhã e a tarde no triquitiqui.
Uma sereia canta os futuros feitos dos portugueses na Índia.
Tétis leva o Gama ao cimo de um monte e mostra-lhe a Máquina do Mundo e todas as terras que os Portugueses hão-de mostrar ao mundo.


_____________________________________________ANTOLOGIA
…..
Vão os anos decendo, e já do Estio
Há pouco que passar até o Outono;
A Fortuna me faz o engenho frio,
Do qual já não me jacto nem me abono;
Os desgostos me vão levando ao rio
Do negro esquecimento e eterno sono.
Mas tu me dá que cumpra, ó grão rainha
Das Musas, co que quero à nação minha!
….
Este receberá, plácido e brando,
No seu regaço os Cantos que molhados
Vêm do naufrágio triste e miserando,
Dos procelosos baxos escapados,
Das fomes, dos perigos grandes, quando
Será o injusto mando executado
Naquele cuja Lira sonorosa
Será mais afamada que ditosa.
….
Não mais, Musa, não mais, que a Lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda e endurecida.
O favor com que mais se acende o engenho
Não no dá a pátria, não, que está metida
No gosto da cobiça e na rudeza
Duma austera, apagada e vil tristeza
E não sei por que influxo de Destino
Não tem um ledo orgulho e geral gosto,
Que os ânimos levanta de contino
A ter pera trabalhos ledo o rosto.
Por isso vós, ó Rei, que por divino
Conselho estais no régio sólio posto,
Olhai que sois (e vede as outras gentes)
Senhor só de vassalos excelentes.